Português Cultural 003: Moda (Recursos & ...

Português Cultural 003: Moda (Recursos & Transcrição)

Apr 30, 2024

Oi, pessoal!

Aqui consta a transcrição EDITADA e sem marcações de tempo do episódio de português cultural 003, sobre moda e Clodovil.

https://open.spotify.com/episode/2gcNSnREoqA1sXSDih8T2i?si=4OB52sz-Si-av3od_sn4ww

Fontes

Transcrição

Que coisa chata. Lá vai. Falar sobre a biografia de alguém. Eu não vou começar com datas e coisas do tipo, porque é muito chato. Eu vou começar dizendo para você: Clodovil era extremamente polêmico. Na verdade, ele ainda é. E quando uma pessoa é polêmica, ela fala coisas chocantes, ela fala coisas absurdas, ela fala disparates. E disparate é uma coisa absurda. Você fica: Eu não acredito que ele falou isso. Mas esse era o Clodovil. Primeiro, Clodovil nasceu na pré-história da moda brasileira. Ele nasceu em 1937. É uma coisa que você tem que saber. Por quê? Naquela época aqui no Brasil, a gente estava passando de uma ditadura para outra. O governo não facilitava para ninguém, tinha censura. O Brasil era muito mais conservador do que é hoje, e Clodovil nasceu. Já criança, quando ele era criança, ele já tinha uma tendência a gostar de moda. Ele desenhava vestidos e fazia modelos, mas não sabia que aquilo ali poderia ser uma carreira. Até porque no Brasil, a carreira de estilista de moda apareceu tecnicamente com o Clodovil. Antes, existiam algumas madames. Geralmente eram mulheres francesas que vinham para o Brasil. Elas tinham casas de costura, são as maisons de couture, eu acho.

 Meu francês não está em dias. E quando eu digo que não está em dias, significa que não está atualizado, então meu francês não está em dias. Mas tinha essas maisons ou essas casas de costura eram muito chiques, que faziam roupas sob medida para as pessoas da alta sociedade brasileira, do Rio de Janeiro e de São Paulo na época. Clodovil nasceu no interior de São Paulo, muito pobre. Tinha uma certa condição, mas não era tão rico, não tinha dinheiro. E na década de 1950, ele começa a carreira como estilista, ali em 1950. Lembrando que em 1954, a gente teve uma conspiração para outro golpe militar de ditadura, mas o presidente se matou. É um épisódio também à parte, é um épisódio separado. Mas é só para você ter noção de como estava a sociedade brasileira na época que Clodovil estava começando a carreira. Era um Brasil de contrastes e contradições. Se você pensa que, por lado, o Brasil estava crescendo economicamente, por outro, os direitos da mulher praticamente não existiam, os direitos, ou melhor dizendo, as leis contra racismo não existiam, e ainda mais para proteger minorias, como os grupos LGBTQIA+ – eu não me lembro exatamente de todas as letras – mas não existia nenhum tipo de lei para proteger.

 E Clodovil era, ele não era assumido, ou seja, ele não dizia para as pessoas: Eu sou gay, mas ele era e não negava se alguém perguntasse. Claro que a palavra que usavam na época não era gay. Era uma palavra muito negativa que ainda hoje se usa. E ele começou a fazer carreira como estilista. Na década de 1960, ele foi para Europa e viu lá na Europa o surgimento do prêt-à-porter ou pronto para vestir. Também na Europa, ele viu a coisa chamada de alta costura. E só uma pequena observação: tem algumas leis que regem essa definição de alta cultura*. E quando eu digo algumas leis que regem, são algumas leis que organizam e determinam o que isso pode ser. E aqui no Brasil, não se pode produzir alta costura nos termos franceses. Ou pelo menos, não se podía produzir alta costura nos termos franceses. Já quando a gente fala de prêt-à-porter, são roupas prontas para vestir, que não existia no Brasil na época. Cada roupa que você comprava, você comprava de uma costureira, comprava de um alfaiate, que são os profissionais que preparam roupas. Mas não tinha uma loja que você ia e comprava lá, não. Então, ele trouxe essa ideia para o Brasil, fez algum sucesso, mas ele também fez sucesso como radialista e também como apresentador de televisão.

 Como radialista, ele fez muita polêmica e acabou perdendo o emprego. Ele criticou a roupa da primeira-dama, e a primeira-dama é a esposa do presidente. Ele criticou a roupa da primeira dama, o presidente ligou para a rádio e disse: Tira esse pip daí. Claro que ele falou uma palavra bem negativa. E Clodovil foi demitido. Mas Clodovil era muito ativo na publicidade, então ele conseguiu um emprego na televisão. Ele trabalhou com a Marília Gabriela, inclusive. Mas também foi demitido porque não fechava a boca. No final das contas, ele conseguiu abrir uma coisa de alta costura aqui no Brasil, mas ele não conseguia ficar parado. Ele acabou sendo político também. É uma vida bem longa, uma vida bem ativa. Então, lá no guia de aprendizagem eu tenho algumas notas adicionais e também tenho fontes para você pesquisar, dar uma olhada, caso a vida dele interesse a você. Basicamente, as coisas que ele fez pelo Brasil, primeiro, ele trouxe a alta costura ou a ideia de alta costura para o Brasil, que sem ele não teria, realmente. Ele trouxe a moda de ateliê, que era uma moda requintada, e uma coisa requintada é uma coisa chique.

 Muitas pessoas, por exemplo, gostam de jantar muito requintado com o seu marido ou sua esposa para o aniversário de casamento. Já eu não sou muito requintado, não. Eu gosto de hamburgão. Na vida do Clodovil, porém, nem tudo foram flores. Ele sofria muito com baixa audiência na televisão. As pessoas viam o programa, mas não era tão interessante, e não continuavam vendo. E ele também colecionava polêmicas. Eu não sei exatamente por que ele fazia isso, eu acho que era mais por publicidade, por vontade de causar. E quando a gente diz vontade de causar, quando uma pessoa quer causar, ela quer chamar atenção, ela quer chamar atenção para si por causa de algum motivo. E eu posso dar um exemplo. Imagine que você está em casamento na hora que o padre diz: Se alguém tiver um motivo para que essa união não se concrete*. Fale agora ou cale-se para sempre. Alguém que só quer causar, vai levantar a mão e dizer: Eu, eu não acredito que ele vai casar com ela. Aí por quê? É porque ela é tão bonita, ele é tão feio. Essa pessoa quer só causar. Daí, Clodovil teve essa vida longa, que eu resumi aqui em oito minutos e não cabe aqui.

 Basta vocês saberem que ele é tão presente na mídia brasileira ainda hoje que você vê vídeos, entrevistas sendo republicadas, porque Clodovil foi o grande pioneiro da moda brasileira. Mas será que só tem o Clodovil? Não. Tem outros também. Mais uma coisa, que eu falo para vocês aqui no Brasil, não sei se tem no país de vocês, no país onde você está agora, mas aqui no Brasil a gente tem muitas lojas populares de roupa. E são roupas baratinhas, são roupas populares e não são roupas de grife, não. Algumas das lojas mais populares são a Riachuelo, que mudou de nome recentemente, ela agora só são consoantes. Não dá para ler o nome da loja, mas todo mundo conhece como o Riachuelo. E tem a C&A, se eu não me engano. E é uma lojinha muito simples. Você vai lá, simples, vamos lá, deixa eu definir. É simples o processo de comprar. Você chega na loja, pega uma cestinha e vai no departamento que você quer. Por exemplo, tem departamento de roupas ou moda infantil, moda masculina e moda feminina. Nessas lojas de roupas, eles também vendem perfumes e têm algumas variedades, tipo material escolar. Eu nunca entendi por que tem material escolar, mas tem muita coisa nessas lojas.

 Aí você lá, pega a sua bolsa ou uma cesta que eles dão e vai escolhendo as roupas. Depois de escolher essas roupas, você pega aquelas que sejam do seu agrado, ou seja, você pega aquelas roupas que deixam quando você feliz, que elas são do seu agrado, e leva essas roupas para o provador. No provador, você experimenta as roupas, fica com as roupas que você quer pagar e comprar, claro, e deixa lá as roupas que você não quer. Aí você vai no caixa, faz o pagamento. E muitas dessas lojas têm um cartão próprio. O que é isso? É um cartão de crédito emitido por um banco em parceria com uma loja de roupas. É uma parceria para o crime, porque os juros dos cartões de lojas são altíssimos. Você pode comprar R$ 100,00 de roupa e aí você deixa de pagar um mês, no mês seguinte, R$ 150,00. Realmente é roubo, é uma armadilha. Eu nunca tive cartão de loja e eu odeio. Acho que você pode perceber, mas muitas pessoas no Brasil têm cartão da Riachuelo, cartão da C&A, cartão da Renner, que é outra loja de roupas em massa. Inclusive, essas lojas de roupas são a evolução do pret-a-porter ou o pronto para vestir dos franceses.

 Você chega lá, compra roupa, escolhe o seu número e foi. Tem roupa de todos os tamanho, mas para os tamanho maiores ou menores, tem menos oferta. Muito provavelmente, você vai precisar procurar uma loja especializada. Por exemplo, hoje nós temos muitas lojas plus size, e a gente fala dessa maneira, plus size, e tem lojas também com roupas menores, mas para adultos. As pessoas mais baixinhas, as pessoas de estatura mais baixa, podem comprar roupas para adultos nessas lojas. E eu menciono isso porque eu conheço algumas pessoas. Inclusive eu tenho uma amiga que ela tem 1,40 m, se eu não me engano, 1,38 m. Ela é bem baixinha. E aí quando ela vai comprar roupa, ela disse que às vezes ela compra em lojas de roupas infantis, porque não tem roupa para adulto do tamanho dela. Não é uma loucura? Outra solução para as pessoas que precisam de roupas feitas sob medida, ou seja, roupas feitas exatamente para elas, são as costureiras. Aqui no Brasil é uma coisa muito comum, é uma profissão, inclusive, muito comum, que é a costureira. E eu digo costureira porque a grande maioria são mulheres. Muitas dessas costureiras trabalham por conta própria, ou seja, elas trabalham em casa e fazem a própria produção.

 Mas muitas dessas costureiras também prestam serviços para empresas de costura e confecção. Aqui eu tenho algumas palavras interessantes, mas quando você presta serviço para alguém, você faz um serviço para alguém. Eu, por exemplo, sou professor de português e eu presto serviços de ensino para os meus alunos. Se você for contador ou enfermeira ou enfermeiro ou contadora, é todas das formas masculinas e femininas das profissões, você vai prestar serviços em um hospital ou em um escritório de contabilidade. Mas voltando para as costureiras, eu vou citar a história de uma pessoa que eu conheço. Eu vou chamar ela de Maria, só para ter um nome. E Dona Maria, ela é costureira desde que eu me entendo por gente. E quando eu digo: Desde que eu me entendo por gente, é uma outra maneira de dizer: Até onde eu consigo lembrar. Então, anote: Desde que eu me entendo por gente, ela é costureira. E ela é, ainda hoje, costureira. Dona Maria deve ter uns 78, 79 anos hoje. E ela criou a família, ela ganhou o sustento só com costura. Ela costurava por conta própria e também costurava para uma confecção. Por conta própria, era muito simples. Às vezes, por exemplo, eu mesmo fui cliente dela, eu tinha uma roupa e a roupa rasgava, tinha buraco.

 Eu chegava lá para a Dona Maria e dizia: Dona Maria, tem como consertar? Ela fazia o conserto rapidinho. A roupa estava costurada, eu pagava ela e a gente saia cada qual no seu quadrado. Mas também a Dona Maria fazia as roupas por encomenda. Ou seja, eu chegava lá para a Dona Maria e dizia: Dona Maria, eu estou precisando de cinco cuecas, que são as roupas de baixo. E aí eu dava o material para a Dona Maria, dava o tecido, ela cortava, costurava, me entregava, eu experimentava e pã, dizia: Está ótimo, pagava a Dona Maria. Ela só fazia cueca? Não. Ela fazia muita coisa. Cueca era mais rápido de fazer. Eu lembro que ela falava muito disso, mas ela fazia blusas, vestido, tudo o que você pensasse, ela fazia. Só que o fluxo de pedidos, ou seja, o número de encomendas que as pessoas faziam, era muito baixo. Então ela tinha que trabalhar nesse meio tempo para outra pessoa. Ela trabalhava com uma confecção, que é uma grande associação costureiras aqui no Brasil, e a confecção deixava produtos na casa dela para ela fazer o acabamento, ou seja, para ela fazer a partezinha final do trabalho, e ela entregava depois de um mês, uma semana, tinha prazo específico.

 Então, quase sempre você vai ter uma costureira no seu bairro. Não se você morar em prédio, apartamento assim, às vezes as pessoas não falam, mas se você mora em bairros mais populares, lá no Ceará, por exemplo, a gente tem muita costureira. Aqui na Bahia também tem, mas eu vejo menos aqui porque aqui tem muito prédio e pouca casa, comparando com Fortaleza. Você talvez se pergunte: ah, Eliaquim, mas tem diferença entre a costureira e o alfaiate? Talvez você escute esse nome, "Alfaiate". Geralmente, o alfaiate é uma coisa mais chique, ele vai ter atelier, vai ter uma oficina. E geralmente, o alfaiate faz roupas que a gente considera masculinas, como o terno, paletó, essas coisas assim, mas faz para homens e mulheres. Em geral, alfaiates trabalham com homens, mas podem trabalhar com mulheres também. E em geral é um homem, então é o alfaiate. Hoje em dia, o alfaiate também trabalha na televisão, costurando roupas para atores e atrizes, mas tradicionalmente, esse é o alfaiate. Eu, pessoalmente, nunca vi um alfaiate na minha vida. Eu só ouvi falar, tipo, uma história para assustar crianças, tipo "ó, o alfaiate". Mas eu sei que eles existem. E para as pessoas que precisam de roupas bem específicas, especialmente homens, os alfaiates ajudam bastante.

 Uma coisa que tem ficado cada vez mais popular aqui no Brasil, com costura e coisas do tipo, é o faça você mesmo. Muitas pessoas compram a própria máquina de costura e costuram as roupas em casa ou preparam algumas coisas em casa, ou têm uma máquina de costura para fazer uns consertos rápidos. Nada que exija muito trabalho. Bom, e isso tudo foi só para falar de algumas coisas. Hoje você ouviu pequeno resumo e a importância de Clodovil e o estereótipo de uma pessoa extremamente polêmica aqui no Brasil. Ouviu falar pouco do desenvolvimento da moda, que até 1960, a gente não tinha moda popular, esse do Prêt-à-porter, dos franceses, não tinha em grande escala. Clodovil continuou ali com a vidinha dele, mas ele não era o grande, grande, Bambambam, não. Não, tinha sempre as costureiras, os alfaiates e as pessoas que trabalham no dia a dia para fazer esse país ficar de pé, não é só de uma pessoa que se faz um mercado. Espero que você tenha gostado. Deixe suas perguntas e se você tiver dúvidas e quiser a transcrição desse episodio, dê uma olhada para ver se você pode participar do programa de educação continuada.

 Até a próxima.

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